O Santo Daime é uma manifestação religiosa surgida em plena região amazônica nas primeiras décadas do século XX. Consiste em uma doutrina espiritualista que tem como base o uso sacramental de uma bebida enteógena (para os cientistas, uma droga psicodélica[1]), o ayahuasca, com o fim de catalisar processos interiores e espirituais sempre com o objetivo de cura e bem estar do indivíduo. A doutrina não possui proselitismo, sendo a pratica espiritual essencialmente individual, sendo o autoconhecimento e internalização os meios de obter sabedoria.
Segundo seus adeptos, a doutrina do Santo Daime é uma missão espiritual cristã, que encaminha os seus praticantes ao perdão e a regeneração do seu ser. Isto acontece porque o daimista, ao participar dos cultos e ingerir o Santo Daime inicia um processo de auto conhecimento, que visa corrigir os defeitos e melhorar-se sempre, para que possa um dia alcançar a perfeição.[carece de fontes]
Nos rituais sempre há uma forte presença musical. São sempre cantados hinos religiosos e são usados maracás, um instrumento indígena ancestral, na maioria dos locais de culto.
Surgiu no estado brasileiro do Acre, no início do século XX, tendo como fundador o lavrador e descendente de escravos Raimundo Irineu Serra, que passou a ser chamado dentro da Doutrina e por todos que o conheciam como Mestre Irineu. Após conhecer a bebida sacramental chamada de ayahuasca pelos nativos da região Amazônica, Irineu Serra teve uma visão de características marianas, em que um ser espiritual superior lhe entrega a missão do Santo Daime.Índice [esconder]
História
Raimundo Irineu Serra nasceu em São Vicente Ferrer, no Estado do Maranhão em 1892. No final da primeira década do século, embarcou para o então Território do Acre para trabalhar nos seringais, onde se estabeleceu próximo à cidade de Brasiléia, na fronteira com a Bolívia. Foi ali que Raimundo Irineu Serra, conhecido pelos discípulos como Mestre Irineu, teve sua iniciação com a ayahuasca (um dos muitos nomes da beberagem), recebendo a missão de uma entidade feminina associada com a Virgem Maria (Virgem da Conceição ou Rainha da Floresta) de expandir a doutrina e utilizar todo o conhecimento nela inserida para a cura.
Mestre Irineu não inventou a ayahuasca, foi apenas responsável pela cristianização do seu uso, rebatizando a bebida a partir do rogativo "Dai-me Amor", "Dai-me Firmeza", etc. A nova seita religiosa mesclou elementos culturais diversos como as tradições caboclas e xamânicas, o catolicismo popular, o esoterismo e tradições afro-brasileiras.
Na década de 1930 inicia seus trabalhos espirituais com um pequeno grupo de seguidores nos arredores de Rio Branco e, com o passar dos anos, viu esse grupo aumentar em tamanho e importância no cenário acreano. Raimundo Irineu Serra faleceu em 6 de julho de 1971. Após seu falecimento, houve dissidências, sendo a mais famosa, a liderada por Sebastião Mota de Melo, responsável pela expansão da Doutrina para outros estados e países a partir do início da década de 1980[3].
Em 2006, estimava-se em aproximadamente 10.000 os seguidores dessa doutrina no Brasil e no mundo. Há centros legalmente instituídos em quase todos os estados brasileiros e em países como Espanha e Países Baixos, além de grupos que celebram os cultos em países como Estados Unidos, Canadá, Japão, Argentina, Chile, Uruguai, Venezuela e Portugal[4].
A doutrina ficou então dividida em duas vertentes principais:
O Centro de Iluminação Cristã Luz Universal (CICLU) - Alto Santo - dirigido pela viúva do mestre, Peregrina Gomes Serra.
O CEFLURIS, fundado pelo Sebastião Mota de Melo, natural de Eirunepé, Amazonas. O Centro Eclético de Fluente Luz Universal Raimundo Irineu Serra (CEFLURIS) foi registrado em 1974, com sede na cidade do Rio Branco, como um centro espírita estruturado sob a forma de sociedade religiosa sem fins lucrativos, responsável pela organização da Doutrina e pela feitura e distribuição da bebida sacramental utilizada nos rituais.
Inúmeros centros independentes ou não diretamente ligados ao CICLU ou ao CEFLURIS surgiram após a expansão para o resto do país. Um dos mais recentes desdobramentos desta expansão é o surgimento de centros independentes, que promovem sincretismos com a Umbanda, O Espiritismo, o Hinduísmo[carece de fontes].
O uso ritual de substâncias psicoativas como a ayahuasca vem sendo discutido em vários países. No Brasil, o CONAD (Conselho Nacional Antidrogas) do Brasil, retirou a ayahuasca da lista de drogas alucinógenas conforme portaria publicada no Diário Oficial da União em 10/11/2004, permitindo o uso ritual.
O ministro da Cultura, Gilberto Gil, encaminhou em 2008 ao IPHAN[5], um processo para transformar o uso do chá de ayahuasca, em patrimônio imaterial da cultura brasileira[6].
Liturgia
Nas várias linhas atuais há diversos tipos de trabalhos, sendo considerados trabalhos oficiais da Doutrina os relativos a datas festivas (como São João, Natal), os trabalhos de concentração (realizadas nos dias 15 e 30 de cada mês), os trabalhos de cura como Estrela e São Miguel. Dentro da Linha do Padrinho Sebastião há ainda trabalhos mediúnicos como de Mesa Branca ( leia sobre Umbandaime).
A liturgia do Santo Daime é essencialmente musical e o cerimonial consiste no canto de hinos, acompanhado por instrumentos musicais como violões, tambores, flauta, teclados, e tradicionalmente pelos maracás. Os trabalhos de concentração e cura são feitos com os participantes sentados em seus lugares (sempre divididos entre homens e mulheres) em volta da mesa central. Há também os trabalhos de bailado, em que os participantes executam passos individuais e padronizados durante a execução dos hinos (também sendo separados os homens das mulheres). São três os ritmos utilizados nas cerimônias Daimistas tradicionais, a marcha, a valsa e a mazurca. Cada ritmo tem seu próprio toque de maracá e seu passo específico. O objetivo é executar os hinos e o bailado com a máxima afinação entre os participantes (a corrente), afim de que se possa atingir um estado de elevação de consciência.
Para participar de uma cerimônia daimista, é necessário usar roupas preferencialmente claras, evitando decotes, bermudas e blusas sem manga. Além disso, as mulheres devem usar saias abaixo dos joelhos. Os Daimistas utilizam um vestuário ritual em suas cerimônias, chamadas "fardas", sendo elas de dois tipos: uma chamada de farda branca e a outra chamada de farda azul, possuindo variações para homens e mulheres. Todo Daimista fardado traz na sua farda sobre o peito esquerdo a estrela de Salomão com a águia e a lua crescente, simbolizando uma visão do Mestre Irineu.
Fora da Amazônia
A "doutrina da floresta" acabou por se expandir pelo Brasil e pelo mundo. Ganhou muitos novos adeptos, incluindo pessoas famosas e de destaque na mídia. Como uma das características do Santo Daime é o conceito de Centro Livre, ou seja, o antidogmatismo e o não-sectarismo religioso, passou a sofrer influencia de diversas tradições espiritualistas e a dar origem a outras vertentes, muitas das quais distanciaram-se muito da doutrina do Mestre Irineu. Ao penetrar em áreas onde era grande a influência de religiões afro-brasileiras, acentua-se as influências negras que já estavam presente em menor escala na doutrina. Influencia a Umbanda também, pois esta passou a utilizar o chá em alguns pontos.
É interessante também destacar que existem diversos cultos espalhados pelo Brasil e pelo mundo que utilizam a ayhuasca como sacramento, como a UDV (união do Vegetal), proveniente de Rondonia, sem contar as hordas de "ayhuasqueiros" que utilizam a bebida de forma independente ou não-ritualistica, e que não devem ser confundidos com o Santo Daime.
Nos grandes centros do país, o Daime passou também a ser praticado por grupos de pessoas que já possuíam crenças alternativas, como as religiões orientais. Portanto o Santo Daime em alguns locais recebeu essas influências, em detrimento de suas origens caboclas. Apesar disso,as linhas autênticas de Daimistas, geralmente ligados ao CICLU e ao CEFLURIS, estão empenhados e compromissados em manter e preservar as tradições do Santo Daime da forma como esta Doutrina foi vertida da floresta para o resto da humanidade.
Legislação para uso do chá
Em janeiro de 2010 o governo brasileiro formalizou legalmente o uso religioso do chá ayahuasca, vetando o comércio e propagandas do mesmo, que só poderá ser utilizado com fins religiosos e não lucrativos, com a criação de um cadastro facultativo para as entidades que o utilizam. A bebida chegou a ser proibida no país em 1985, sendo liberada dois anos depois, e ocorreu uma nova tentativa de proibição nos anos 1990. Atualmente não havia impedimento para o uso do chá em cerimônias religiosas, porém não existiam orientações para o seu uso em conformidade com o direito.[7]
Atualmente
Diversos centros estão espalhados pelo Brasil, a maioria seguindo fielmente a vertente originada na Amazônia por Mestre Irineu, estima-se que hoje em dia sejam cerca de 15000 adeptos em constante crescimento[carece de fontes], e contam com uma organização solidária e sem fins lucrativos.
Alguns centros estão situados em grandes cidades como São Paulo (Céu Sagrado, Jardim de Belas Flores, Céu de Maria, fundado pelo cartunista Glauco, e Céu da Capela, este último liderado por Padrinho Alexandre).
Em 2010, o cartunista Glauco foi assassinado por uma pessoa que frequentou a doutrina. A família do assassino acusa o consumo do chá, de leva-lo a ter delírios psicóticos que desencadeou o assassinato
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